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E eu a pensar num cachecol que perdi pouco tempo depois de me o oferecerem num aniversário de há alguns consideráveis anos. Eu a andar a pé por entre o jardim com árvores de cores tão superiores às dos tubos de tinta.
E lembro-me do que perdi em vez do que vejo agora.
Perdi um guarda-chuva, também ele oferecido exactamente num aniversário, estava a começar a gostar dele. Fazia uma bela concha de protecção e embora de uma elegância particular , aprendi a subtileza do seu tom neutro. Tinha recentemente percebido que se me ajustava, que podia ser o princípio de uma amizade.
Tenho sapatos velhos que no longo convivio nos reconhecemos sem ser preciso conversarmos. Assim são estes amigos envolventes, partilhados e usados. Cada borboto da camisola de lã guarda um tempo. Estranho este afecto. Existem máquinas que retiram os borbotos da lã. Mas de cada vez que vejo alguém usá-las sei que perdem a parte do seu corpo e da memória comum.
O que perdi não lhe assisto ao envelhecimento e apuramento de cumplicidade, é uma relação quase platónica. O que não perco e me acompanha, ajeitamo-nos na simples deformação do rosto que se enruga de cada vez que ri ou chora.
Espero que o cachecol ainda exista envolto noutra relação e talvez o guarda-chuva já se tenha perdido de quem o encontrou outra vez. Não sei porquê julgo que neste caso, o seu tom neutro e as varetas duplas lhe concedem ( o que espero seja ) a graça de viajar por entre muitas experiências.
Perdi um chapéu feito em lã. Será que o chapéu dirá que me perdeu a cabeça? Acho que não. Alguém que tenha cabeça pode usar o chapéu, foi feito por alguém que na altura estava próxima de mim. Acho que mesmo sem poder contar a bela história que está presente quando se oferece o trabalho dedicado a outro; não há objecto que consiga mesmo na sua subtracção dizer a alegria que é receber de alguém uma prenda.
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